Friday, August 27, 2004

Visões

Nas falhas quentes das feridas abertas
Percorre a minha língua laminosa
O homem passeia o seu animal
Com o olhar invisivel saboreando o chão
A senhora das rugas, caminhos marcados na sua face,
sente uma pedra na sua cabeça
uma faca a retirar o coração.
As janelas que se impõem na sombra
falam do nada que vêem
O chão ergue-se e cai
Um homem passeia o jornal
As palavras morrem esmagadas umas contra as outras
O vento lânguido sufoca as roupas expostas
viola-as, toma um gole de ar e adormece
Os homens e as mulheres entram e saem para rezar a um café e copo de água
E ter fé que o dia morra para voltarem ao silêncio das suas tumbas


Em frente a uma miragem artificial

Nos seios marcados que vislumbram o tempo
No suspiro trespassado de águas que alcançam o céu
Os rostos escondem-se por entre o verde morto
A árvore descaída acorrenta-se ao chão
Os vermelhos encostos arrastam-se pela estrada espezinhada
por uivos e risos de lágrimas
As lembranças passaram por aqui mas ninguém sabe
Os rastos planos atravessam as águas que se afogam
As pedras incomodam-se umas ás outras para um qualquer corpo se deitar
nos inconsoláveis dias de monotonia de longos hábitos
Os olhos vermelhos permanecem estáticos
mirando o movimento mecanizado dos estóicos prazeres
Ninguém sabe que todos sabem
Neste céu que corrói
Ninguém sabe que existe


Ao terminar estas palvras escorre-me pelo pensamento
o veneno do porquê que se molesta com fragmentos de espinhos enferrujados
O sentido a que se dá à nossa própria moléstia
As dúvidas inconsequentes fazem um caminho nas linhas de um papel branco
Estamos todos em branco
Invisíveis, desaparecidos

A consequência a que damos o nome de coisas inexplicáveis
a esfera em que nos fechamos para dizer que amamos
o medo que revitaliza as veias marcadas de pó
Somos invisíveis, as aparições sopram no corpo
e o fastio floresce, mergulhando na invisibilidade de nós
Todos julgamos ser máritires
gritamos como se de uma virtude se tratasse
Descemos os olhos para o crepúsculo do chão e soltamos uma lágrima de pena
"Ainda foi melhor outra vez"
Diz um sorriso feminino para um ardor masculino encostado ás suas coxas
A água canta enquanto morre na terra frágil
onde esguios verdes se aborrecem
Ao emigrar nesta folha branca
perdi o sorriso feminino e o ardor masculino
talvez fossem morrer para outras águas
Tenho as unhas negras de me escorraçar
O cigarro e o seu fumo flutuam nas minhas entranhas e de lá saem invisiveis
Esta capacidade infiel de sermos autistas e de julgarmos ter poder sobre nós...

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