Wednesday, April 06, 2005

O Náufrago - Thomas Bernhard

Sunday, April 03, 2005

"Tudo é ridículo quando se pensa na morte"- Thomas Bernhard

Os meus olhos só te avistavam de passagem longuinquamente de um terceiro andar furtivo. De vez em quando acenavas quando a minha voz soletrava aos teus ouvidos. Nunca conheceste as minhas quatro paredes que desembocavam num rio de estrada por onde pairavas todas as noites.
Nunca te conheci muitas palavras. Só naquelas noites em que múrmurio de gente familiar se gargalhava ou mastigava palavras dissolventes, só aí te conhecia a tua voz rouca. O olhar sério mas profundo de um enigma por descobrir. Quem foste?
Só agora me dei conta de quem foste, ou de quem gostaria de saber que foste? Será muito confuso apadrinhar estas palavras como minhas? Que estranho não saber nada de ninguém e sofrer com alma o que se sabe? Nada.
O silêncio era o que mais conhecia em ti. Que palavras me dirias, que voz terias ao falares de ti, do teu eu, feliz ou pesaroso?
Nunca te conheci. Muitas vezes me questionava quem eras tu? Um sobrevivente ou um vivente clandestino?
Não te imaginava como um eu da minha vida, mas também não te concebia como um aparte que não pudesse ver mais.
A vida tem destas coisas, ambiguamente sólidas e líquidas.


R.I.P M.P.